Tenho que partilhar convosco um dos dilemas mais significativos da minha vida enquanto jovem petiz. Desde sempre ouvi a minha mãe, minhas avós e tias apregoarem de peito aberto frases como: "não deixes queimar o estrugido!" ou mesmo "está na hora do comer, vou fazer o estrugido". Essa palavra, "estrugido", de difícil pronuncia para um jovem imigrante de terras Chavescas, sempre ocupou o meu pensamento pois continha o segredo do sucesso duma refeição, em especial do suculento arroz branco da minha avó. Digamos que estava no pedestal das palavras místicas/divinas.
Eis que chega o dia em que perco o chão. Lembro-me perfeitamente dessa visita de estudo a terras da mouraria. Tinha eu 14 anos, bigode farfalhudo e 3 pelos negros no queixo quando ouço uma palavra nova: "refogado". Que raio quereria dizer aquilo?! Em conversa com a professora de português chego a uma triste conclusão: refogado e estrugido são sinónimos... Como poderia ser possível?! O segredo mais bem guardado da cozinha portuguesa tinha um sinónimo, e ainda por cima com som da linha de Cascais?!
Deixo aqui a minha revolta perante a centralização, mesmo da língua portuguesa. "Refogado" é uma palavra chique, talvez de influência da nouvelle cuisine francesa. "Estrugido" não, é uma palavra forte, com espírito e densidade, tão característico da NOSSA cozinha! Não concedo comer um cozido cujo arroz tenha sido feito tendo por base um "refogado"...
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2 comentários:
Na verdade, estrugido tem aquele cheiro característico.. já o refogado pode ter uma variedade de cheiros...
Eu diria que merecias um pulitzer por esta :)
(nao ligues 'a Ligia, ela nunca fez um estrugido de certeza!)
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